"Surpreendeu-nos..."

“ ...menor de nove anos, figurinha entroncada de atleta em embrião, face acobreada e olhos escuríssimos e vivos, surpreendeu-nos pelo desembaraço e ardileza precoce. Respondia entre baforadas fartas de fumo de um cigarro, que sugava com a bonomia satisfeita de velho viciado. E as informações caíam, a fio – quase todas falsas, denunciando astúcias de tratante consumado. Os inquiridores registravam-nas religiosamente. Falava uma criança. Num dado momento, porém, ao entrar um soldado segurando um [rifle] Comblain, a criança interrompeu a fala contínua. Observou, convicto, entre o espanto geral, que ‘a Comblé’ não prestava. Era uma arma à-toa, ‘xixilada’ fazia um ‘zoadão danado’, mas não tinha força. Tomou-a; manejou-a com perícia de soldado pronto; e confessou, ao cabo, que preferia a ‘Manuliche’ (Mannlicher), uma carabina ‘de talento’. Deram-lhe, então, uma Mannlicher. Desarticulou-lhe agilmente os fechos, como se fosse aquilo um brinquedo infantil predileto. Perguntaram-lhe se havia atirado com ela em Canudos. Teve um sorriso de superioridade adorável: ‘-E por que não? Pois se havia tribuzana velha! Haverá de levar pancada, como boi acuado, e ficar quarando à toa, quando a cabrada fechava o samba desautorizando os praças?!

Aquela criança era, de certo, uma deformidade estupenda. E um ensinamento. Repontava, bandido feito, à tona da luta, tendo sobre os ombros pequeninos um legado formidável de erros. Nove anos de vida em que se adensavam três séculos de barbárie.”

Euclides da Cunha em ‘Os Sertões’, 1899




segunda-feira, 3 de junho de 2013

por que NÃO?

saltadores à distância, boxeadores, jogadores de futebol
ultimate fighters...
Por que não (também), alunos?




proposta aberta, voltada para  prover Educação de excelência, no sentido de a melhor e mais refinada instrução escolar para os melhores entre os mais pobres. Oferecer às crianças e adolescentes mais dotados das comunidades mais destituídas, oportunidade de desenvolvimento igual à oferecida pelas melhores instituições de ensino do país aos estudantes das camadas mais privilegiadas socioeconomicamente. 

O público-alvo desta proposta são os jovens adolescentes e crianças pobres que possuem atitudes claramente superiores à média de seus pares ou, em outras palavras, que possuem capacidade de progredir mais rapidamente que os demais em seu meio de desenvolvimento e/ou aprendizadoCrianças sem-problemas, exceto pertencer a meios sociais destituídos economicamente.

Muitas crianças e adolescentes
...e duas questões

questão 1
por que só para os melhores e não para todos ?

Os vestibulares, os concursos, os exames de ordens... são processos seletivos de melhores, porquanto é impossível oferecer Educação de Qualidade Excelente para todos. Ainda.
Porém, esforço dirigido e concentrado do Estado na Educação de excelência para os melhores é fato em países como Canadá, Rússia, Israel, Singapura, Taiwan, Coréia do Sul e China... 
No caso do Brasil, séculos de descuido quanto ao processo de inserção social resultaram na enorme desigualdade econômica e cultural responsável pelo estado de quase-guerra civil entre os “no topo” e os “na base” da pirâmide social de nossas grandes metrópoles. E disponibilizar apenas para os “no topo” ensino fundamental e médio nas melhores escolas e destinar para os “na base” os cursos de formação técnica, nada mais é do que repaginar o modelo de diferenciação e segregação social responsável pelas mazelas sociais existentes entre nós desde o princípio da colonização.

Importa que o Estado e a sociedade brasileira, juntos, executem ações cativantes no âmbito da Educação, ações estratégicas direcionadas a criar, por irradiação em círculos concêntricos, lideranças aptas a se tornarem paradigmas de desenvolvimento cultural exemplar para seus pares comunitários “na base”, isto é, outras crianças e adolescentes capazes de –por imitação prestigiosa e com o passar do tempo- ampliar o campo de realização das mudanças comportamentais necessárias para conter-se o avanço (fácil, constante e maciço) da mediocridade e bestialização, a grassarem “na base” e a contaminar o todo.  

questão 2
por que criar uma escola especial ?
(e não utilizar as melhores escolas já existentes)

O público-alvo desta proposta são indivíduos que, em geral, possuem uma característica intelectual individualista, livre e solitária, voltada para o conhecimento por prazer e que, via de regra, estão mal-integrados no meio-social. Não estão interessados em sujeitar-se à realidade de uma situação de aprendizado imposta pelas escolas tradicionais, orientadas para construção de um saber que eles acreditam ‘já sabem’ ou que ‘não interessa’. São indivíduos que, a despeito de possuírem curiosidade; facilidade de expressão oral ou riqueza de vocabulário; capacidade de se apropriar de conhecimento por si mesmo, manifestam problemas comportamentais de natureza específica no aprendizado escolar: inquietação, mal-estar, enfado..., sentimentos passíveis de conduzir à rejeição escolar. Tais manifestações, frequentemente, estão associadas a um sentimento de incompreensão por parte da escola, na medida em que esta se mostra incapaz de explicar ou solucionar tais problemas. Em ambientes escolares não adequados a atender suas necessidades peculiares, tais indivíduos sofrem: ir à escola lhes exige um esforço considerável. Para tais indivíduos, as situações mais críticas são aquelas onde o desequilíbrio ou a desarmonia é mais acentuada, de modo a induzir-lhes a uma ênfase excessiva nos domínios onde se sentem mais à vontade –desafiando a inteligência comum- e a abandonar aqueles orientados ao desenvolvimento da sociabilidade e/ou habilidades motoras diversas.

No sentido de melhor cuidar e habilitar estes indivíduos, a atitude de pais e professores, suas relações, as escolhas pedagógicas e o modelo de escola têm influência determinante.

Nenhum comentário: